Esplendor luso-barroco
Projeto nasceu do antigo Convento de São FranciscoA Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, situada no Largo de São Francisco, é um importante marco histórico da cidade. Embora a criação dos Cursos Jurídicos tenha sido em 1827, a construção do clássico endereço de educação é de 1934. Após o fim da Primeira República, teve início o processo que levaria à demolição do antigo Convento de São Francisco, em taipa, para a construção, no mesmo lugar, do atual edifício da Faculdade de Direito, em estilo que mescla o neocolonial ao barroco.
Para realizar o projeto arquitetônico, foram contratados os profissionais do Escritório Técnico Ramos de Azevedo, Severo & Villares, primeiramente com a ideia de empreender uma reforma da edificação antiga, plano que acabou sendo descartado. A parte mais substancial da demolição deu-se em 1935, sob o comando do arquiteto português Ricardo Severo. Naquele ano vieram abaixo as antigas fachadas, as arcadas e quase tudo o que havia. Algumas salas ainda foram mantidas para permitir a continuidade das aulas, mas estas seriam demolidas na fase seguinte das obras, que só seriam totalmente concluídas em 1942. Assim registra o processo de demolição a Faculdade de Direito da USP:
Após o fim da Primeira República (1930), porém, teve início o processo que levaria à demolição do antigo convento para construção, no mesmo lugar, do atual edifício da Faculdade de Direito. Em 1931, o novo diretor, Alcântara Machado, para enfrentamento dos novos tempos, concebeu uma reforma tripartite da Faculdade: administrativa, pedagógica e material.
(FDUSP, 2023)O novo edifício foi construído em um período de grande tensão política, que envolveu a tomada do poder por Getúlio Vargas (1930), a Revolução Constitucionalista (1932), a criação da Universidade de São Paulo (1934), a promulgação de uma nova Constituição (1934) e a instalação do regime autodenominado “Estado Novo” (1937).
Sobre o estilo predominante no edifício, João Paulo Campos Peixoto (2022) afirma que o neocolonial surge no Brasil em um contexto cultural complexo e transicional. O autor cita como marco inaugural do movimento uma conferência proferida em 1914 justamente pelo arquiteto Ricardo Severo, na Sociedade Artística de São Paulo, intitulada “A Arte Tradicional do Brasil”. À época, discutia-se o que seria a estética verdadeiramente brasileira da vanguarda na arquitetura.
João Paulo Campos Peixoto afirma que o neocolonial surge no Brasil em um contexto cultural complexo e transicional. O autor cita como marco inaugural do movimento uma conferência proferida em 1914 justamente pelo arquiteto Ricardo Severo, na Sociedade Artística de São Paulo, intitulada “A Arte Tradicional do Brasil”. À época, discutia-se o que seria a estética verdadeiramente brasileira da vanguarda na arquitetura.
O neocolonial viria a alcançar seu apogeu nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro somente nos anos 1920, o que o aproxima cronologicamente de duas vertentes notáveis no cenário cultural e arquitetônico brasileiro: o ecletismo, corrente amplamente em voga naquele momento, e a arquitetura de viés racionalista (que viria a se fixar na historiográfica como Movimento Moderno). Em um momento em que a identidade nacional [da arquitetura] não era consolidada, o neocolonial se insere em um verdadeiro embate ideológico, cuja principal questão se centrava em qual seria a arquitetura representativa do Brasil.
(PEIXOTO, J. P. C., p. 10-11, 2022).Imponente, o edifício que abriga a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo substituiu um convento franciscano de arquitetura tipicamente colonial. A construção de taipa deu lugar ao palácio revivalista barroco proposto por Ricardo Severo.
A caixilharia desenvolvida nas oficinas de serralheria do Liceu reproduz os motivos florais em sua forma. Entre as aberturas, pode-se visualizar o átrio central do edifício.
Os arcos plenos são preenchidos pela riqueza dos vitrais desenvolvidos pela Casa Conrado Sorgenicht. A escadaria de mármore tem no guarda-corpo traços claros do revivalism0 luso-barroco proposto por Severo.
Tombado como patrimônio histórico do Estado de São Paulo em 2002, o prédio abriga importante acervo cultural e artístico, como os vitrais da escadaria, produzidos pela Casa Conrado Sorgenicht, e os mobiliários do Salão Nobre e da Sala da Congregação, confeccionados no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. Pinturas e esculturas de artistas renomados também estão distribuídas pela faculdade. A biblioteca, que em 1825 já contava com acervo reunido pelos frades franciscanos, tornou-se a primeira biblioteca pública de São Paulo, antes mesmo da inauguração da instituição acadêmica. É possível conhecer parte desta história no Museu da Faculdade de Direito, situado na Sala São Leopoldo, primeiro andar do prédio histórico.
O célebre engenheiro-arquiteto Ramos de Azevedo já era falecido e o projeto foi assumido por seu sucessor, o engenheiro-arquiteto e erudito português Ricardo Severo. Defensor de uma arquitetura que fosse moderna, mas reverenciasse o passado luso-brasileiro, concebeu um edifício com ambientes amplos, bem iluminados e arejados e generosas áreas de circulação, ao mesmo tempo que nele imprimiu características inspiradas em antigas construções coloniais. Assim criou uma das mais importantes edificações realizadas em sintonia com o movimento polêmico mas vigoroso que defendia a valorização da ‘Arte Tradicional no Brasil’, título de um trabalho seu de 1917. Não se baseou, porém, na singela arquitetura colonial paulista, de que era representativo o próprio convento do Largo de São Francisco, e sim no colonial, sobretudo mineiro.
(FDUSP, 2023).O edifício da Faculdade de Direito foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), órgão da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, por meio da Resolução SC 185, de 12 de dezembro de 2002, publicada no Diário Oficial do Estado em 1º de janeiro de 2002, que, em seu artigo 1º, estabeleceu:
O edifício da Faculdade de Direito foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), órgão da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, por meio da Resolução SC 185, de 12 de dezembro de 2002.
Fica tombado como bem cultural de interesse histórico, arquitetônico e urbanístico o conjunto arquitetônico da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco da Universidade de São Paulo, incluindo a Tribuna Livre na calçada fronteira, situados no Largo de São Francisco, nesta Capital. Trata-se de marco histórico de extrema importância para a história cultural do País, bem como exemplar arquitetônico vinculado aos códigos formais do neocolonial, corrente que na década de 1930 expressou a busca e legitimação de uma arquitetura nacional, utilizando-se do repertório do barroco brasileiro, reelaborado pelo arquiteto Ricardo Severo
(FDUSP, 2023).Esta releitura da estética neocolonial com traços evidentes do barroco português se manifesta não apenas na arquitetura, mas no entalhe do mobiliário cuidadosamente desenvolvido no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. A coerência da linguagem em diferentes escalas foi uma das maiores contribuições do Liceu, que em diferentes materiais pôde, por meio da técnica aprimorada, respeitar os diversos estilos recriados em suas oficinas.
Em consonância com a estética do edifício, a madeira reproduz nos entalhes a estética neolonial luso-barroca, em curvas sinuosas e pináculos nas espaldas das cadeiras. O couro preensado reproduz motivos florais e garante aspectos ergonômicos do mobiliário. Na mesa principal, a altura dos encostos acompanha a hierarquia da presidência da mesa durante as cerimônias.
O Salão Nobre recebeu projeto de mobiliário específico desenvolvido e confeccionado pelo Liceu de Artes e Ofícios.
A linguagem da fachada neocolonial se reproduz nos interiores, com o movimento sinuoso expresso no frontão externo e no adorno que emoldura a porta dos elevadores.
© Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo